segunda-feira, 22 de agosto de 2011

I Encontro #PFE: debates, troca de experiências e articulações políticas

De 09 a 11 de agosto, integrado ao 4º Festival de Teatro Independente de Santa Maria, ocorreu o I Encontro Nacional do Palco Fora do Eixo. Artistas, estudantes, produtores culturais e agentes do Circuito Fora do Eixo reuniram-se durante três dias, no SESC, para compartilhar experiênciar e participar das discussões sobre gestão cultural, artistas cênicos em rede e políticas públicas e alternativas de fomento às artes.




O debate sobre gestão cultural contou com Ana Paula Galvão, do GestaCultura, de São Paulo,e Carol Tokuyo, do Casa Fora do Eixo São Paulo. Galvão presta consultoria em gestão para artistas, principalmente grupos teatrais, sobre planejamento, plano de marketing e comunicação e uso de mecanismos de incentivo. "Não dá para os artistas ficarem esperando, hoje. É preciso ter protagonismo. Todo mundo produz e quer fazer seu trabalho aparecer e circular", afirmou Ana Paula, que também é professora da SP Escola de Teatro. Para ela, os artistas devem procurar se diferenciar e repensar os modelos de gestão, buscar soluções alternativas para circulação e distribuição do trabalho artístico.
Tokuyo falou da experiência de gestão do Circuito Fora do Eixo, dando exemplos ligados à área da música, mas que podem ser aplicados às artes cênicas. A colaboração, as parcerias, a ampliação do espaço simbólico da rede, a articulação para reduzir custo das produções e as formas variadas de captar recursos foram citadas como caminhos para desenvolver a cena teatral e fazer um trabalho artístico se sustentar e circular.  "Há uma rede de articulação pronta para ser utilizada. É preciso ocupar os espaços, ficar atento aos editais e trocar tecnologia.  Se nos perguntarmos por que é importante se organizar em rede, vou responder: porque é estratégico. A estratégia de desenvolvimento em rede é eficaz". Neste processo, os 80 pontos que formam o Circuito Foram do Eixo são plataformas de circulação, pontos de distribuição e de comunicação, que estão a serviço dos artistas. O Fora do Eixo também tem um Banco de Projetos que pode ser utilizado pelos grupos de teatro para se inscrever nos editais.



Os integrantes dos grupos de teatro participantes do Encontro relataram as movimentações e projetos realizados em suas cidades. Lucas Santarosa, do grupo Zibaldoni, de Ribeirão Preto (SP), falou sobre  as iniciativas de ocupação de espaços e de fortalecimento do teatro na sua cidade. Um dos projetos implementados foi o “Circulando”, criado para mapear espaços culturais alternativos no centro e na periferia  e realizar apresentações teatrais mensais."A ideia é movimentar a galera todo mês com atividades". Conforme Lucas, em Ribeirão Preto existem vários grupos de teatro, mas ainda não há uma boa integração entre eles. O contato do grupo com o Fora do Eixo se deu através do Coletivo Fuligem do qual participam.

Luise Sherer, da Cia Teatro de Bolso, de Santa Maria, relatou que os estudantes de artes cênicas da cidade costumavam se formar e ir embora devido à ausência de movimentação da cena local. “Não havia uma cena teatral em Santa Maria”. Hoje, a realidade é um pouco diferente. Os grupos estão se estruturando, se integrando e constituindo parcerias para fortalecer a cena local. O Palco Fora do Eixo e o Fetism são exemplos dessas novas reorganizações do trabalho cênico. A atriz Mariana Lohmann, da Cia EntreLinhas, lembrou também que os artistas da cidade precisam quebrar seus egos, participando, por exemplo, de festivais de teatro amador.


O ator Willian Sieverdt veio de Rio do Sul (SC) para participar do Encontro do PFE. Ele é presidente da Federação Catarinense de Teatro e diretor da Trip Teatro de Animação, uma companhia de teatro de bonecos.  Conforme Sieverdt, a Federação tem hoje 120 grupos de teatro cadastrados em SC. Willian conta que veio a Santa Maria para conhecer melhor o Palco Fora do Eixo e o que ele pode agregar à produção teatral em sua cidade. "O intercâmbio, os trabalhos colaborativos, a colaboração mútua entre os grupos são processos que existem em SC e que se assemelham ao trabalho do PFE". Uma das tradicionais movimentações cênicas de Rio do Sul é o Festival Catarinense de Teatro que está em 16ª edição e ocorre de 01 a 06 de novembro. Conforme Willian, o Festival, que tem apoio da LIC estadual, ocorre em diversos espaços como bairros, escolas, empresas, praças. Ano passado, a Mostra oficial contou com 12 grupos do Estado.



Márcio Silveira dos Santos, da Rede Brasileira de Teatro de Rua (RBTR), participou do segundo dia de Encontro que abordou "Artistas Cênicos em Rede". A RBTR reúne articuladores das redes regionais de todos os estados da Federação. Em Porto Alegre, Márcio, que trabalha com teatro de rua há 20 anos, atua no grupo teatral Manjericão. Para ele, é importante pensar em como as redes podem dialogar, principalmente dentro da perspectiva de artes integradas. "Através do fluxo de diálogo dá pra traçar estratégias e contribuir com novos caminhos para as artes integradas no Brasil. Queremos agregar mais pessoas, trazê-las para o debate. Acreditamos que o PFE entra neste diálogo sobre as artes integradas e pela sua abrangência pode contribuir muito". A RBTR, surgiu em 2007 e realiza de um a dois encontros por ano. A rede trabalha com o conceito de artes cênicas na rua, artista em espaço aberto, o que inclui teatro, artes circences, dança, malabares, estátua viva, entre outra manifestações.
Outra preocupação trazida por Santos se refere aos dois grandes eventos que vão ocorrer no País: a copa do mundo e as olimpíadas. "Queremos saber como a cultura estará inserida nestes dois eventos. que imagem cultural do Brasil será passado ao mundo?". Marcio também tem atuação no Conselho Nacional de Políticas Culturais e do Colegiado Setorial de Teatro, instâncias da sociedade civil que participam da elaboração de políticas públicas para a área.


O I Encontro do PFE também contou com a presença do diretor do grupo Teatro Andante e ex-diretor de artes cênicas da FUNARTE, Marcelo Bones. Ator e diretor, Bones, 50 anos, trabalha com teatro há 34 anos. No grupo Teatro Andante, que existe há 20 anos em Belo Horizonte, atua como diretor e ator. O grupo faz apresentações na rua e em salas. Também é professor da Escola de Teatro, uma fundação cultural de MG.
Contou que resolveu participar do Encontro por curiosidade e vontade de conhecer melhor o funcionamento do Palco Fora do Eixo. "Vivemos um momento de quebra de paradigmas, de rediscussão sobre a representação, o papel do Estado, a organização em rede e o agir localmente; é um momento de construção". Bones foi diretor de artes cênicas da  FUNARTE em 2009 e 2010. Conforme ele, a FUNARTE deveria rever seus parâmetro, atuando mais como articulador entre Estados e Municípios do que como órgão formulador de projetos.


Os debates do Encontro do PFE não poderiam deixar de abordar as Políticas Públicas e Alternativas de Fomento para a área. Representanto da Secretaria de Cultura de Santa Maria, Fabio Vasconcelos, disse que o poder público valoriza as parcerias, mas admitiu que a pasta funciona mais como uma secretaria de Eventos do que de elaboração de políticas públicas. Também afimou que o fundo de cultura será implementado até o final do ano. 
O coordenador de desenvolvimento institucional do grupo Teatro Vila Velha, de Salvador (BA), Ciro Sales, compartilhou sua experiência na Secretaria de Cultura do Estado da Bahia onde trabalhou na atual gestão. Contou que lá há uma estrutura desenvolvida de intercâmbio teatral. O Fundo Estadual de Cultura é o principal mecanismo de fomento da área, financiando e apoiando projetos. No entanto, na opinião de Sales, a LIC continua sendo fundamental. "Aumentamos o percentual da lei de incentivo. Pequenas e médias empresas podem investir valores menores". Outra ação da secretaria baiana foi a realização de programa de microcrédito que financia projetos de até dez mil reais, beneficiando artistas populares, por exemplo, e trabalhando com um conceito mais amplo de cultura, que inclui lazer, esportes, gastronomia. "Pra dar um exemplo,VJs e DJs tem comprado equipamentos de trabalho com este tipo de crédito". Para projetos mais ambiciosos, com valor a partir de cem mil reais, também há um programa de crédito. Conforme Sales, o próximo passo planejado pela Secretaria é setorizar os fundos, criando financiamentos específicos para dança, artes visuais, teatro etc.

Sobre políticas públicas, Carol Tokuyo falou da importância de se participar de conselhos, fóruns, conferências e outras organizações deliberativas da sociedade civil. "Devemos usar as instâncias participativas para articular e cobrar ações do poder público. Não se fica parado porque não há políticas públicas", afirmou ela, destacando que no Fora do Eixo, o Pcult é a frente que tem este papel de provocar a discussão sobre políticas culturais. "O Pcult não tem objetivo de ser um partido; é uma rede suprapartidária com vários agentes culturais que se propõe a pensar sobre politicas culturais transversais e pautar a cultura".Também destacou que mapear grupos que se organizam e movimentam a cultura da cidade é uma estratégia poderosa para chamar a atenção do poder público.
Contribuindo com a discussão, Marcelo Bones enfatizou que é preciso repensar a ideia de que o Estado é um propositor único de políticas públicas. "Não vale mais achar que o Estado é perverso, que está do outro lado do balcão que separa estado e agentes. Nossa relação com o estado vai ter que mudar e está mudando”, afirmou Bones, acrescentando que é preciso buscar outras lógicas, deixar de lado a vitimização.

A gestora do Palco Fora do Eixo no FDE, Claudia Schulz, relatou que fazer as coisas acontecerem, mesmo com poucos recursos, chamou a atenção da Secretaria de Cultura de Santa Maria que fazia pouco caso da  cultura independente. Para Cláudia, o encontro do PFE mostra a força do Circuito e potencializa a busca por mais fomento para a área. "Essa construção de políticas vai muito dessa forma de se organizar enquanto Circuito. Agir em bloco possibilita o alcance das coisas de forma mais rápida".



O I Encontro do Palco Fora do Eixo foi assim: debate sobre gestão, organização em rede e políticas públicas. Espaço de trocas, compartilhamento de experiências e construção de perspectivas para as artes cênicas.
O próximo Encontro Nacional ocorre em 2012, em Belo Horizonte.